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Tarifaço pode desconfigurar cadeia logística brasileira

Os empresários brasileiros vivem dias de incertezas causados pela iminência da tarifa extra de 50% sobre as vendas aos Estados Unidos prometida por Donald Trump para 1º de agosto. No setor de logística, a Aprile Brasil, filial da multinacional Aprile SPA, diz que todos os seus clientes brasileiros frearam os envios ao mercado norte-americano desde o anúncio do presidente norte-americano, em 9 de julho.

“Trabalhamos com mais de 60 exportadores e todos seguraram suas exportações. Estamos com muito menos volume que o normal”, disse Federico Battaglia, General Manager da Aprile Brasil. Responsável pela intermediação entre as empresas exportadoras e os armadores - incumbidos do transporte marítimo das cargas -, a operadora logística envia anualmente cerca de 4 mil contêineres do Brasil para os Estados Unidos.

Apesar da empresa possuir outras frentes, a relação comercial com os norte-americanos representa cerca de 10% das cargas operadas pela Aprile Brasil. “Esse anúncio das tarifas traz indecisão para o nosso negócio porque vemos o exportador cancelando o booking (reserva nos navios). Isso não significa que eles não vão mais fazer negócios, mas estão analisando se a taxa vai seguir efetivamente”, diz Battaglia.

Ele diz ainda que a sobretaxa americana pode comprometer todo o desenho logístico atual. “Os armadores escolhem as rotas, tarifas e quantidade de navios que enviam ao porto com base na quantidade de mercadorias carregadas para exportação e importação, porque, para eles, precisa ser economicamente rentável tanto a ida como a volta”, diz Battaglia.

Em um cenário mais grave, os armadores podem diminuir as escalas nos portos brasileiros, acompanhando a redução das cargas de exportação, explica Battaglia, o que interfere diretamente na eficiência logística e pode implicar em aumento dos custos para o envio das mercadorias, afirma.

“Imagine uma situação em que um armador decide escalar um navio para um porto uma vez por mês, mas esse navio já está cheio. O próximo disponível só atracaria em 45 dias, mais 20 dias de trânsito. Nessa situação, o cliente vai receber o produto em dois meses e meio, quando poderia receber em 30 dias”, diz o representante da Aprile Brasil.

Com essa ineficiência logística, muitos exportadores brasileiros correm o risco de perder seus parceiros comerciais, ou ter de fazer uma programação assertiva e antecipada. “Os exportadores e importadores de ambos os países saem prejudicados.”

O cenário não é descartado pela coordenadora do Conselho de Comércio Exterior da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Rita Campagnoli, que tem lidado com armadores preocupados com a situação. “O tarifaço ameaça toda a cadeia logística, o que afeta o preço do frete e dos portos", diz.

Mudanças nas rotas marítimas podem ser uma das soluções adotadas pelos armadores para não serem afetados pela redução da demanda para exportação. No entanto, essa ação teria impacto direto nos exportadores, que contariam com uma menor quantidade de navios para os Estados Unidos, o que poderia até mesmo sobrecarregar os portos.

“Imagine que antes a rota de um navio era passar pela China, França, México e Brasil e acontece essa troca de rota e ele deixa de parar no Porto de Santos ou no de Paranaguá, ou até mesmo não vem mais para o Brasil. Com essa mudança, as mercadorias acabam acumuladas no porto, reduzindo as áreas para armazenagem de contêineres.”

Outro cenário que pode sobrecarregar os portos, como consequência da sobretaxa de Trump, envolve a busca por novos mercados. “Se antes do tarifaço, em um porto existia uma quantidade de carga para a Europa e outra para os Estados Unidos, com o tarifaço, as cargas que iriam para os Estados Unidos podem ser redirecionadas para a Europa. Isso gera uma sobrecarga para essa cadeia”, explica Rita, que menciona que os portos precisam se readequar pensando nesse novo cenário. “O próprio porto precisa se reconfigurar já que pode haver mudanças na programação dos navios, acordos logísticos, e isso gera custo de transição”, diz.

Além de afetar o trânsito de exportação e importação, a tarifa pode ter impacto até mesmo na logística interna brasileira, segundo a especialista, uma vez que, com menos demanda nos portos, pode haver ociosidade nas frotas rodoviárias e ferroviárias. “Outra questão que tem sido pouco discutida é o impacto na mão de obra dentro dos terminais portuários”, diz Rita, que vê a possibilidade de redução no quadro de funcionários.